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""É preciso se preparar para a guerra""

Para ex-ministro, governo deve retomar política de preços mínimos para dar mais segurança aos produtores rurais

A crise americana já impacta o agronegócio brasileiro e exige medidas rápidas do governo para evitar uma quebradeira no campo. O alerta é do ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. Ele discorda dos analistas que acreditam que o setor agropecuário brasileiro, bola da vez no mercado mundial, está imune aos efeitos da crise. Na avaliação dele, a crise imobiliária americana causa a fuga dos capitais que financiam as exportações e agrava os problemas que os agricultores já enfrentam, como aumento no custo de produção e falta de crédito.

Rodrigues contou ao Estado que, na incerteza, muitos agricultores estão desistindo do plantio. Aos que o procuram, recomenda plantar apenas o que puder com financiamento agrícola ou, se possível, com recursos próprios. Ao governo, ele sugeriu medidas como crédito mais rápido e a retomada da política de preços mínimos de garantia para dar segurança ao setor. O ex-ministro pesou cada palavra com o cuidado de não causar pânico, mas não contemporiza: "É preciso se preparar para a guerra", disse.

Que efeitos a crise americana acarreta para o setor agropecuário brasileiro?

O primeiro efeito é na disponibilidade de crédito rural. Em relação ao crédito, tínhamos um problema interno independente da crise externa, determinado pelo brutal aumento de custo para os produtores rurais decorrente da alta nos preços dos fertilizantes, dos combustíveis e do aço.
Tínhamos uma demanda de mais reais por hectare para o crédito de custeio em função desse custo de produção. O que aconteceu foi uma redução nos depósitos à vista quando houve a extinção da CPMF. Como esses depósitos são a maior fonte de recursos para o crédito rural, tivemos um descasamento entre a maior necessidade e a menor oferta de crédito. Ainda em relação à questão interna, muitos produtores que teriam acesso ao crédito em situação normal não terão porque não resolveram seu próprio endividamento. A esses dois fatos se agrega um terceiro ainda de origem interna que era a expectativa pleiteada pelo próprio governo de aumentarmos em 5% a produção, com aumento de área plantada inclusive, para o Brasil se credenciar a ocupar os mercados que se abriam com preços mais elevados, em função do desequilíbrio entre oferta e demanda de alimentos em termos globais.

E ainda vamos ter esse aumento de produção?

A idéia do governo era produzirmos mais para ocupar esse mercado criado pela explosão de demanda nos países emergentes, onde as populações e a renda per capita vêm crescendo mais do que nos países desenvolvidos. Essa demanda agregada não foi atendida por uma maior oferta até mesmo em função de secas em vários países do mundo, entre os quais o Brasil que, em 2005 e 2006, deixou de produzir mais de 25 milhões de toneladas por causa de condições de clima adverso. Portanto, precisávamos de mais reais por hectare, e como teremos mais hectares
plantados, um volume adicional para a área a ser plantada. Isso já indicava uma safra mais cara e custosa, com menos crédito. Aí vem a crise e interfere nesse cenário. Interfere de maneira negativa em três vertentes. Primeiro, no financiamento das multinacionais, moageiras, tradings, sobretudo de soja, que representam quase 30% da oferta de crédito para essas culturas. Essas empresas tiveram corte de crédito nas suas matrizes e estão deixando de financiar sobretudo o produtor de soja. Houve redução de crédito especialmente no Centro-Oeste, onde estão
os grande produtores. A segunda vertente foi a redução do Adiantamento de Contrato de Câmbio, o ACC, que é o recurso que financia as exportações, inclusive as agrícolas. No ano passado, o agronegócio exportou o equivalente a 36% de todo volume exportado pelo Brasil em dólares. A escassez de recursos para a exportação pode comprometer até o próprio saldo comercial da balança brasileira. O terceiro fator: o sistema financeiro brasileiro está assustado com esse processo e tem burocratizado o crédito para o agricultor. Embora existam regras, o dinheiro não está chegando na mão do agricultor. A agricultura é uma atividade com tempestividade. Se o dinheiro chegar depois da chuva, depois do plantio, é inútil. Todos esses fatos sinalizam uma safra muito mais cara, muito mais exigente de recurso de crédito e com muito menor disponibilidade desse crédito.

Mas esta safra já não está salva pelo agricultor que comprou os insumos lá atrás?

Uma boa parte sim, mas nem todo mundo comprou. O setor de fertilizante teve no primeiro semestre deste ano o maior semestre de sua história em termos de venda, mas o segundo semestre está deplorável. As vendas estão muito baixas. O agricultor não é bobo, ele já botou as barbas de
molho. Sei de casos de agricultores que, assustados, tentaram passar adiante sementes e adubos adquiridos para a safra, e não encontraram interessados. A oferta de máquinas para aluguel no campo é impressionante e não há demanda.

Os preços dos produtos agrícolas continuam num bom patamar. Isso não ajuda?

Os estoques mundiais de milho, trigo e arroz, estão entre 30% e 40% mais baixos do que estavam há sete anos, o que determina preços mais altos. A demanda nos mercados emergentes continua aquecida, pois não houve queda da renda per capita. Mas se a crise se estender por muito mais
tempo ou se aprofundar, é possível que os preços caiam em dólar lá fora, mais do que cairam até agora. Vamos ter que deixar de comprar coisa que vem da Ásia da Europa, e aí você tem desemprego lá. Temos de ficar atentos para esse que é o pior cenário e que tem um complicador
adicional. É o fato de que a China, e também a Índia, grandes compradores inclusive de soja, podem eventualmente contribuir, por interesses comerciais, para a redução de preços. Se ficarem 20 dias sem comprar, o mercado reage, joga o preço lá para baixo e piora muito mais o cenário.
Tem um fator mitigatório: se o dólar ficar valorizado, está tudo resolvido. Porém, suponha que a recessão seja ainda mais profunda e derrube também o dólar de novo. Se isso acontecer, é o inferno astral da agricultura brasileira, porque você tem uma safra cara, com pouco crédito, e preços relaxados para o produto final.

A queda nos preços do petróleo não traz algum alívio?

Pode melhorar se cair muito de preço, mas isso vai acontecer só na colheita e será pouco na composição final do custo. Ao cenário pior agrega-se uma última má possibilidade: a de, diante da escassez de crédito e do alto custo de produção, o agricultor reduzir o padrão tecnológico, abrindo
mão do adubo ou da semente certificada. Aí corre o risco de ter redução significativa de produtividade. Esse é o pior dos cenários possíveis e pode levar a uma quebradeira no campo, transferindo os problemas para o resto do País, com reflexo na indústria de insumos e queda no
padrão produtivo que o Brasil tem hoje. Aí teríamos redução na oferta de alimentos, queda nas exportações e o risco de um processo inflacionário lá na frente, possivelmente em 2010.

Como o agricultor deve se comportar ante esse cenário?

É preciso se preparar para a guerra, sem criar pânico, mas com agilidade e firmeza. Estou propondo que o governo reative de maneira vigorosa um instumento que é muito bom para tempos de guerra, que é uma lei chamada política de garantia de preços mínimos. O governo precisaria fazer duas coisas imediatamente: o recálculo dos preços mínimos que estão completamente defasados, anunciando que valerão já na próxima safra, e pôr dinheiro para valer no Ministério da Agricultura para ele poder atuar como operador dos preços mínimos.

O cenário vale para o produtor de carne?

Se o consumo cair , vale também para o pecuarista. Não é a mesma coisa para frango e suíno, porque se os preços despencarem, os custos de produção deles caem também. Para frango e suíno, se o consumo despencar por problema de renda, haverá reflexo. Tem ainda a questão do petróleo para a Rússia, que responde por grande parte das nossas exportações de frangos e suínos. Com menos renda do petróleo, será que os russos vão continuar importando na mesma escala? É uma posição, não de pessimismo, mas de cuidados.

Ante esse quadro, que recomendação o sr. daria para o agricultor?

O produtor rural brasileiro já percebeu que tem um cenário nebuloso e está se precavendo. A recomendação é de que ele plante apenas o que puder plantar com o crédito rural disponível, com a taxa de juros adequada, eventualmente com recursos próprios. E também com a melhor tecnologia disponível para não cair, nem no aumento de endividamento, e nem na perda de produtividade. Barba de molho, e atenção total no noticiário para saber até onde vai essa crise.

José Maria Tomazela
O ESTADO DE SÃO PAULO - 12/10/2008

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